Embora a visibilidade midiática a respeito do tema seja ainda um pouco reduzida, há, de acordo com o “Livro de Contrato de União Estável Homossexual” – uma espécie de documento, onde se registra acordos do tipo, fornecidos por nove entidades representantes de direitos homossexuais ou de direito humanos de sete estados, cerca de 200 uniões entre casais de mesmo sexo no Brasil, sendo que a primeira ocorreu em 2003.
Estes dados contrariam a afirmação veiculada na imprensa (e no texto anterior a este) de que a união civil entre o jornalista Felipeh Campos e o produtor de moda Rafael Scapucim fosse o “primeiro casamento gay celebrado no país”. Poder-se-ia alegar que há neste evento, que será realizado no dia 10 de abril deste ano, características que fizessem jus à denominação “casamento”, como afirmou Felipeh, um dos noivos, no site de notícias do Yahoo, “É sim o primeiro casamento gay, pois é o primeiro que segue o figurino, com tudo protocolado: da lista de casamento ao bem-casado (a lembrancinha de casamento). Além disso, vamos ter uma cerimônia religiosa, no candomblé”. Todavia, no que concerne ao aspecto religioso, isto não representa ineditismo, pois segundo Luiz Mott, fundador do GGB (Grupo Gay da Bahia), desde a década de 70 realizava-se “casamentos” em terreiros de Umbanda. O próprio Mott teve cerimônia de “casamento” religioso semelhante quando se uniu a Marcelo Cerqueira, atual presidente do GGB, em 1988.
Para Andressa Marques, pós-graduada em Comunicação Social pela UFMG, é necessário que os grupos de sexualidade estigmatizada lutem contra a invisibilidade para alcançar o respeito social, “no momento em que (os referidos grupos) desejam lutar por direitos, por reconhecimento social e pela estima alheia, eles devem empreender tentativas de levar suas vozes para o espaço público de discussão e visibilidade”.
Conquistar cotas de visibilidade no espaço público não é algo que se pode conseguir com facilidade. Marques destaca que, antes de tudo, os indivíduos sexualmente estigmatizados precisam romper as barreiras do espaço privado, o que significa expor a própria identidade diante dos outros. Porém, ao realizar três entrevistas com militantes da causa GLBT (gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros) para a consecução do seu trabalho, ela ressalta que “Para se exporem diante de um público ampliado, os entrevistados apontam que é preciso vencer os riscos de ser julgado e avaliado pelo olhar do outro. Um “outro”, identificado como “a sociedade” ou como “eles”, que é implacável em suas observações dirigidas pelo preconceito e pela homofobia”.
No ano passado, mais especificamente no dia 25 de março, publicou-se uma reportagem no jornal Estado de São Paulo, onde era abordado o crescimento quantitativo de personagens gays em telenovelas globais. A primeira vez em que um casal gay foi exibido em em uma novela data de 1988. As atrizes Lala Deheinzelin e Cristina Prochaska interpretavam um casal de lésbicas em "Vale tudo" - novela exibida pela Rede Globo (1988-1989). Entretanto, esta mesma reportagem utiliza o termo “homossexualismo” no corpo do texto. Luís Mott, fundador do Grupo Gay da Bahia, salienta que o uso deste vocábulo não é mais apropriado, visto que “o termo politicamente correto para definir o amor entre duas pessoas do mesmo sexo é homossexualidade e não homossexualismo. A idéia do "ismo" está ligada a uma patologia, a uma doença. Em 1985, o Conselho Federal de Medicina excluiu o homossexualismo como doença, mesma medida tomada em 1990 pela Organização Mundial de Saúde. Em 1999, o próprio Conselho Federal de Psicologia também reforçou que a homossexualidade não é doença. Qualquer tentativa de cura da homossexualidade vai contra os princípios éticos da medicina e psicologia”.
De acordo com Renata Pallottini, especialista em televisão, há uma idealização do casal homossexual, de forma semelhante ao que fizeram com o negro. “Grande parte da sociedade ainda é muito preconceituosa, então não dá para passar dessa fase de idealização, por enquanto. Tem que explorar mais o tema para depois fazer com que casais gays sejam como casais hetero”, afirma. O jornalista André Fischer ratifica, “nas novelas, os gays são lindos, bem resolvidos, ricos, etc., isso é para a aceitação do público. É lindo, mas não retrata a realidade, mesmo assim, é positivo. É melhor ver a intimidade do casal gay no quarto do que um beijo xoxo”, afirma. (opiniões extraídas da reportagem publicada originalmente no jornal Estado de São Paulo e disponível na rede através do blog Carioca Virtual)
Murilo Arruda, mestrando em Ciências Sociais, encara a atual visibilidade homossexual como algo positivo porque “ela obriga o outro (a sociedade, no caso) a ver um mundo específico, provoca alguma transformação”. Ele destaca ainda que a importância não reside no fato da opinião gerada ser positiva ou negativa, o que vale é a familiaridade proporcionada com outras experiências de sexo, gênero e corpo. “Qual sociedade, qual povo não estranha uma forma diferente da sua instituída? A questão é criar novas disposições sociais”, argumenta.
quinta-feira, 3 de abril de 2008
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Um comentário:
Depois de um filme ganhador de oscar e outros caubóis e não-caubóis gays nas novelas das oito, acho que o aumento da visibilidade permitiu que pelo menos fosse muito mais comum encontrar pessoas que, prontamente, numa conversa acidental sobre o assunto, se declarassem liberais.
O pessoal de lá da agência é declaradamente liberal, claro, mas preferem ficar brincando de dizer ‘la ele’ toda vez que alguém diz alguma coisa que possa soar, o que é sempre inexplicavelmente cômico, minimamente homossexual. Ninguém pode ‘ficar atrás’, ‘colocar tudo’, em ninguém. E estamos falando de arquivos digitais.
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